domingo, 21 de setembro de 2008

Uma aldeia na Beira

Quando o Cristóvão pisou pela primeira vez as ruas tortuosas de S. Vicente da Beira, sentiu um apelo, um encanto, um apetite por aquela terra que nunca mais o abandonaria durante o resto da sua vida. Era pelas férias da Páscoa. A carreira parava a porta do “Noco”, na estrada nacional. Estava uma névoa pardacenta, chovia uma chuva parva miudinha e o ar que se respirava cheirava a fumo de lenha, giestas e estevas e era húmido a mais não poder ser.

Alguns curiosos vieram à porta da venda espreitar mas logo se recolheram desinteressados. A Cecília viera ao seu encontro e beijaram-se efusivamente. Ele afastou-se, recebeu das mãos do condutor a mala que este descera do tejadilho da camioneta e regressou para junto da mulher, a Zulmira, que ainda estava com o braço sobre o dorso da amiga, ambas tagarelando. (ele ainda nem suspeitara da bissexualidade delas.)

Meteram-se pelas ruas estreitas, calcetadas de seixos, onde os pés se esforçavam por manter o equilíbrio, a Rua Direita e junto à Igreja Matriz alcançaram a Travessa da Misericórdia. As casas eram de xisto sem reboco e os cunhais de granito. De granito eram também os aros das portas e das janelas e os rebates por onde se acedia às lojas e às escadas que conduziam ao outro piso. Só havia uma rua com paralelepípedos de granito, a rua do Manuel da Silva, que ia até ao Calvário e entroncava na estrada nacional, junto ao posto da Guarda Republicana, quase à ponte sobre a Ribeira da Ramalhosa, na curva para o Casal da Fraga.

A chuvinha irritante continuava. Foi muito repousante encontrarem o fogo da lareira da cozinha, e a braseira na sala, sob a camilha de tecido rendado e franjado que cobria a mesa redonda, onde todos passaram serões bem agradáveis.


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